Uma semana no Elephant Nature Park - ENP e parece que fiquei um mês ou mais. De tão intenso que foi; do tanto
que aprendi e refleti. Pra escrever esse post tive que respirar fundo várias
vezes (e limpar as lágrimas também). Foi bem difícil, o mais difícil de todos, até então. Não que a semana tenha sido ruim. Foi perfeita!!! Mas a realidade
dos animais que vivem lá, ou melhor, o passado deles, é muito triste.
Vou começar pelo parte boa: a
diversão! O ENP é uma Fundação que existe há mais de 20 anos. Sua fundadora é Lek Chailert, uma mulher incrível, que dedica sua vida aos animais. Lek na língua
Thai significa pequeno, mas de pequena ela só tem a estatura mesmo. É uma das
mulheres mais especiais e incríveis que já tive o prazer de conhecer
pessoalmente. O coração é gigante, o sorriso é largo e as atitudes dela estão
mudando a realidade do elefantes na Tailândia e nos países vizinhos.
Ao todo, éramos quase 80
voluntários de várias idades e vários lugares do mundo. Chegamos no ENP numa
segunda, fomos recebidos por uma equipe super divertida e, logo de cara, fomos
assistir um vídeo que conta a realidade dos elefantes na Ásia (foi pior
que levar um soco no estômago!). Depois fomos almoçar, nos acomodar nos quartos e saber como
seria nossa rotina durante a semana. Os voluntários são divididos em grupos e
cada dia tem tarefas diferentes para cada um deles. As tarefas são: limpar cocô
dos elefantes (que é ótimo porque você pode estar mais perto deles); preparar a
comida (que no final sempre íamos alimentá-los); limpar o parque; colher
milho pros elefantes (que apesar do trabalho braçal é super divertido) e dar
banho nos bichinhos. Todas as refeições são feitas no parque. São refeições vegetarianas
(posso dizer que são quase veganas) e são uma delícia!
Fora as atividades diárias,
tínhamos bastante tempo livre pra descansar, fazer massagem, pensar na vida ou
simplesmente observar os elefantes (juro que poderia fazer isso por horas,
principalmente os bebês que são super divertidos!). Também podíamos passar um
tempo com os cachorros que tem no abrigo dentro do parque. O ENP é um santuário
que abriga vários animais resgatados. Aqui tem mais de 500 cachorros, gatos,
macacos, pássaros, coelhos, búfalos, vacas. Todos foram resgatados de algum
lugar onde sofriam abusos e maus tratos, ou da indústria farmacêutica ou
cosmética, ou do abate, ou do circo etc. No ENP eles podem viver com dignidade!
Também tem a parte social de
conhecer pessoas de quase todos os cantos do mundo e trocar experiências. É
bacana ver o Universo arquitetando esses encontros e como a energia flui. Você
começa a perceber que tem muita gente que pensa como você. Me dá uma sensação
de pertencimento ou de que não sou tão diferente assim como meu pai pensa que sou.. rss.. Uma semana no ENP não
se resume a apenas acordar cedo, trabalhar duro em alguns tarefas, passar algum
tempo com os elefantes e tirar fotos pro Facebook. Significa transformação! Que
pode ser sutil para alguns, ou profunda para outros, depende de quão disponível a pessoa está. Certeza que a Patrícia que chegou no ENP não é a mesma que saiu
de lá. Não tem como não sair transformado! Ouvi um relato que um dos
voluntários decidiu diminuir o consumo de carne e, que aos poucos, vai tentar
cortar a carne de vez e virar vegetariano! Ponto pra ele e pra Lek!
Agora a parte difícil! Vou tentar
seguir a metodologia da CNV (Comunicação Não-Violenta), porque senão não
consigo escrever.
Primeiro passo: os fatos (vou
tentar não colocar nenhum juízo de valor, mas confesso que é difícil) – o elefante
é o animal símbolo nacional da Tailândia. Eles são considerados sagrados e tem
uma relação muito forte com a história e os costumes tailandeses. São animais
que representam sabedoria, poder, longevidade e trazem boa sorte. A população
de elefantes asiáticos vem diminuindo nos últimos anos. Hoje restam cerca de
6.000 elefantes (o que antes era 300.000). Eles vem sendo usados em várias áreas,
mas grande parte delas relacionadas ao turismo. Turistas montados nas costas
dos elefantes é o mais comum de ver por aqui, mas também existem elefantes
andando nas ruas com seus mahouts (a pessoa que cuida deles) pedindo
dinheiro, elefantes “pintando” quadros, atrações circenses e festivais com os
animais. Fora isso, tem a indústria moveleira, que além de destruir as
florestas, usa os animais para carregarem toras pesadas de madeira nas
montanhas. Um breve parênteses: aqui vem outro problema que é a destruição da
floresta. As árvores são protegidas por Lei SE, e apenas se, elas estiverem
vivas. Mortas não tem problema nenhum derrubá-las. O que eles fazem? Colocam
veneno, ou queimam o cerne da árvore e ela vai morrendo aos poucos. Daí eles
vão lá e derrubam árvores de 300 anos de vida. Imagina o tamanho da tora pro
elefante carregar. Imaginou? Ah, e não tem estrada ou trilha, não. É subindo e
descendo ladeira no meio da mata fechada, passando por dentro do rio e todos os
perrengues. Se um elefante quebra a perna ou se machuca nessa atividade, não
tem como transportá-lo para um lugar que possa ser tratado. Muitas vezes eles
são abandonados na floresta e morrem sem ter como se alimentar.
Para que o animal possa fazer
tudo isso, ele é treinado em um ritual chamado Phajaan. Esse treinamento é
torturante e eles buscam com isso “quebrar o espírito do elefante”. Em resumo,
os bebês são separados de sua mãe (isso significa matar a mãe e as tias que
ajudam a cuidar do bebê) e são confinados em gaiolas que eles não conseguem se
mexer. Daí eles ficam dias a fio (sem parar) sendo torturados com todas as
atrocidades inimagináveis, privados de sono, comida ou água. Em geral os machos
levam mais tempo e muitos morrem nesse período. Alguns tentam se matar durante
o treinamento, por isso os treinadores amarram a tromba do animal para que isso
não aconteça. As torturas e maus tratos vão continuar por toda a vida do
animal, menos intensas, mas elas não cessam.
Ah, só pra constar, isso ocorre em toda a Ásia, não só na Tailândia.
Segundo passo: meus sentimentos –
Assistir as cenas do Phajaan foram bem chocantes e doloridas. A primeira coisa
que senti foi uma raiva imensa e um desgosto sem tamanho da raça ao qual eu
pertenço. Sabe aquela frase: “Quanto mais eu começo o ser humano, mais eu gosto
dos animais”? Pois é, ela nunca fez tanto sentido pra mim, como nesse momento. Se
formos analisar friamente, o ser humano é capaz de fazer tanta barbaridade com
sua própria raça, que com os animais fica até parecendo mais fácil de digerir.
Mas não é! Depois de muito pensar, comecei
a refletir o que levam as pessoas a serem parte disso. Desde o treinador, que
na minha opinião faz isso pra alimentar um mercado lucrativo (e de onde ele
tira o sustento de sua família), até os turistas que, muitas vezes sem saber,
contribuem para tudo isso. Lek nos contou que muitas vezes quando ela está em
lugares onde as pessoas passeiam de elefantes ela se aproxima dos turistas e
pergunta: “Você tem ideia do quanto esse animal sofreu pra aceitar que alguém
suba nas suas costas?” As respostas geralmente são as mesmas: “Elefantes são
fortes e podem aguentar”, ou pior “Sinto muito, eu já paguei pelo passeio”.
Mas
depois minha raiva e desgosto passaram. Hoje sinto coragem para ajudar a mudar
essa realidade. E grande parte dessa coragem veio da palestra que a Lek nos deu
no sábado à noite. Queria que todo mundo, uma vez na vida, tivesse a chance de
ouvi-la pessoalmente. Comecei a enxergar que as pessoas boas são a maioria! Tem
muita gente boa fazendo coisas maravilhosas mundo a fora. Quando perguntaram
pra ela o que podíamos fazer para ajudar, ela respondeu que basicamente é um
trabalho de formiguinha. Mesmo que seja de pessoa em pessoa, vale a pena mudar
a concepção e a relação que as pessoas tem com os animais. Ah, só pra constar
(2), estou me referindo a qualquer animal! Desde elefantes, cachorros, gatos e
aqueles que nós seres humanos insistimos em colocar no nosso prato! Como a Lek diz, se amamos elefantes (e nossos bichinhos de estimação) porque não amar todos?
Terceiro passo: minha necessidade
– É muito simples e ao mesmo tempo complicada. Eu tenho a necessidade de viver em união. Isso significa, que eu queria que as pessoas compreendessem que seus atos, desde o mais simples, como respirar, ao mais
complexos, não estão isolados. Queria que as pessoas tivessem a consciência que
tudo está conectado e que o que fazemos reverbera, seja onde for. Basta você decidir
se quer impactar positivamente ou negativamente. Turistar não é diferente! Você
pode escolher se quer ser parte disso tudo ou não. É preciso ter atenção,
porque nem sempre a gente consegue enxergar a maldade que tem por trás das coisas.
Mesmo ficar do lado de um elefante para tirar fotos traz prejuízos. Certeza que
ele foi treinado para aceitar um humano do lado dele. E ainda sim, você pode
observar que os mahouts sempre carregam objetos pontiagudos com eles (às vezes
um simples prego para ninguém ver) que só do animal ver, ele se lembra do
treinamento traumatizante que recebeu e obedece o seu dono. Muitos elefantes, que
hoje estão no ENP e que antes trabalhavam no circo ou nos festivais, são cegos
por causa dos flashs das câmeras. E aqueles que são atropelados por carros
quando estão nas ruas de Bangkok pedindo dinheiro? Geralmente são os bebês que fazem isso, pois são mais fáceis de controlar. E ainda tem os que caem em bueiros na cidade
porque o piso não suporta o peso deles e quebram pernas ou quadril. Outro
exemplo: aqui na Tailândia em alguns templos é possível encontrar pássaros
engaiolados que, por míseros 100 Bath, você pode libertá-los e isso, em tese, traz
sorte pra pessoa que o libertou. Bacana né? Só que não! Esses pássaros são
capturados às vezes a mais de mil quilômetros de distância da cidade e eles
fazem captura em massa. Ou seja, aquela fêmea, que estava voando e procurando
comida pros seus cinco filhotes que ficaram no ninho, foi capturada e não vai mais
voltar pra casa com comida. Adeus filhotes.... E tem mais, imagina o transporte
sofrido que eles passam. E quando são soltos na cidade, eles não estão em seu
habitat natural. Vão morrer atropelado ou virar comida de gato.
Quarto passo: meu pedido – Aqui é
a parte complicada porque eu queria pedir muuuuittasss coisas. Mas vamos por
partes que é melhor! Quando eu vejo a situação que existe por trás do turismo
com animais, sinto coragem para tentar mudar isso, pois tenho a necessidade de viver em união, onde as pessoas entendam que elas são parte de um Todo; que suas ações não são isoladas.
Por isso, da próxima vez que forem viajar (ou mesmo turistar na sua própria
cidade), escolha com atenção seus passeios. E não se sinta culpado ou envergonhado
caso você já tenha andado nas costas de um elefante, ou participado de
atividades com animais. Essa não é minha intenção, porque eu mesma já fui duas
vezes no Sea World e nadei com golfinhos em outra ocasião. Coisas que não faço mais depois de ter assistido o documentário Blackfish. Outra coisa, se você trabalha com turismo
vendendo pacotes, plissssss, não venda esse tipo de passeio. Eu perdi as contas
de quantas vezes me ofereceram isso na Índia. Mas nem tudo está perdido! Se seu
sonho é andar nas costas de um elefante, ou interagir com animais (que é super
bacana), faça pesquisa e visite lugares que de fato se preocupem com a questão
animal, que não usam violência na treinamento. Se for à Chiang Mai, passe pelo Elephante Nature Park (eles tem centros
em outras cidades também). A questão toda se resume em ter consciência, e coerência,
na hora de viajar, de se alimentar, de se vestir e por ai vai.
Desculpa pelo texto gigante, gente!
Precisava desabafar! :)
De brinco de flor!!!
Eu e Lek
Eles são grandes mais são uns amores
Fim de tarde
Bebê curioso se aproximando
Banho de lama
Sorriam pra foto!!!
Preparando a comida deles
No caminhão indo buscar milho pros elefantes
Trabalho pesado mas divertido
Kabu (minha predileta) e seu mahout
Hora do banho
Baby and momy
Eu e Kabu
Batendo um papo com Lek e os elefantes
Pequeno Dok Rak com uma semana de vida