Quando eu comecei a espalhar meus planos
de viajar, a pergunta que mais ouvi foi: “Mas você vai viajar sozinha?” Eu que
não perco o bom-humor por quase nada nesse mundo, já respondia logo: Claro que
não! Não sou doida! Vou com Deus, Buda, Shiva, Krishna, Alah, Nossa Senhora, Maomé, Jah,
Ganesha, ou seja, a rapaziada toda!!!
Daí vinha outra pergunta: “Mas você já
viajou sozinha antes né?” Bem, sim e não! Já viajei sozinha no Brasil, já
peguei voo sozinha para ir encontrar pessoas que me acolheram em outro país,
como quando eu morei no Canadá ou no Bahrein. Mas planejar uma viagem sozinha,
tomar decisões sozinha, comer sozinha, andar sozinha em um país que você nunca
tinha ido antes... não, isso foi a primeira vez.
Pra mim estar sozinha é algo muito
natural, não tenho problema com isso. Acho super bacana o tempo que você tem
pra entrar em contato com seus próprios pensamentos, bater um papo com você
mesma... Posso tranquilamente ir ao cinema com minha única companhia, ou sair
pra jantar alone... Not a big deal! Aliás, li em algum lugar que estar sozinho
é como um vício, depois que você percebe a paz que é, fica difícil lidar com as
pessoas. Não concordo inteiramente com essa afirmação, até porque não gosto de
extremos. O fato é que aprecio e muito a companhia da minha família e dos meus amigos seja para o que
for. Mas tenho que dizer que estar sozinha de vez em quando me traz uma paz sem fim.
Voltando ao assunto da viagem sozinha, eu
simplesmente estou amando essa experiência! Apesar de não ser fácil, tem sido
uma viagem incrível e tenho certeza que eu faria de novo! Dá muito medo, uma
baita insegurança e a ansiedade nem se fala (pode parecer que não, mas me considero
um poço de ansiedade.... Se bem que essa viagem está me ajudando a resolver
isso). O bom é que só você, e mais ninguém, é responsável pelas decisões. Tudo
bem se você cancelar um passeio nas praias paradisíacas da Tailândia só porque você
está com dor de barriga. E também não tem problema nenhum se você passar o dia
inteiro dormindo no quarto do hotel só porque está cansada. Essa
liberdade de escolher o que fazer e para onde ir, ou de mudar de planos na última
hora em não atrapalhar ninguém é sensacional.
Mas como tudo tem dois lados; nem tudo são flores e tem alguns espinhos também. Viajar sozinha significa não ter ninguém pra desabafar em caso de frustrações ou qualquer chateação; não ter ninguém pra tirar fotos suas nem para
te ajudar a fechar a mala, que insiste em aumentar de tamanho. Não sei se isso é geral, mas no meu caso me senti
muito vulnerável várias vezes. É chato você viver desconfiando das pessoas que se aproximam de você pra bater papo; é chato andar
na rua com medo, se sentir acuada; é chato não ter segurança nem para pegar um táxi e ficar achando que o motorista vai te sequestrar. É chato não saber se um
simples “Good Morning” que um homem te dá na rua é só um cumprimento ou ele tem
segundas intenções. É chato (e doentio) viver num mundo machista onde a
mulher é a culpada caso ela sofra um estupro.
Quando eu comecei essa viagem, que por
acaso era a semana de comemoração do dia Internacional da Mulher, lembro que duas
mulheres que viajavam juntas foram assassinadas na Bolívia. Interessante foi
que a mídia noticiou que elas estavam viajando sozinhas. Me pergunto quando foi
que o Aurélio mudou o significado da palavra sozinhas (ou juntas). Como assim
elas estavam sozinhas? A presença de uma outra mulher não conta como companhia?
Tinha que ser de um homem? Isso que a mídia quis dizer, que um homem teria evitado a morte delas? Não sei, mas de
qualquer jeito um homem não foi capaz de evitar o estrupo coletivo, e a
consequente morte, de Jyoti Singh. Ela voltava do cinema com um amigo em Nova
Delhi em dezembro de 2012. Ao entrar no ônibus as nove horas da noite, ela foi
atacada por seis homens, que se sentiram no direito de “dar uma lição nela,
pois mulher direita não anda na rua a essa hora” – palavras de um dos
estupradores. A estória dela foi contada no documentário Filhas da Índia, mas este
é proibido de ser exibido lá. Infelizmente, parece que nada mudou L.
Sim, a Índia é um país perigoso para
mulheres viajarem sozinhas. Graças à rapaziada toda que está viajando comigo e à companhia da Carol, não tive nenhum problema por lá (a não ser o dia que sai
fugida do hotel em Daramshala, porque não gostei da encarada que o cara que cuidava
do hotel me deu). Mas dá pra sentir o medo que paira no ar e dá para observar
que é um país muuuitoooo machista. De qualquer maneira, tem muita mulher que
encara o medo, que se precave de todas as formas possíveis, coloca a mochila nas costas e vai.
Encontrei algumas tantas pelo caminho. Também achei interessante quando cheguei
na Tailândia (e nos países vizinhos que visitei), senti como se um peso
enorme tivesse saído das minhas costas. O medo tinha ido embora! Fiquei
encantada de ver as mulheres nas ruas vestindo o que estavam a fim de vestir
(não interessa se o short é curto ou não) e ainda dirigiam e trabalhavam!
Nossa, um baita contraste com a Índia!
Infelizmente, nós mulheres passamos por muitas situações chatas e desagradáveis (desde o “inofensivo” fiu-fiu na rua até as ofensas mais hostis) seja viajando, ou muitas vezes, na nossa rotina. O fato é que, quanto mais eu viajava pelo sudeste
asiático, mais segura eu me sentia. Mesmo sendo os países mais pobres que
visitei nessa aventura. Até fiz um experimento: eu achava que eu me sentia
segura assim porque não entendia a língua deles. Achava que poderia haver
alguma piadinha sem graça que eu não entendesse. Mas acredite, não existe! Eu
passava por grupos de homens reunidos, e até por prédios em construção, e dava
uma discreta olhada pra trás. Parecia que eu nem existia! Eu achava isso o
máximo! Mas de qualquer jeito, o medo que existe no inconsciente coletivo
feminino (ou no consciente mesmo) me fazia atravessar a rua ou mudar a direção quando eu via um grupo de homens se aproximando.
Acho que o mais importante disso tudo é nunca deixar de viajar, ou fazer qualquer coisa, por medo. Com a devida atenção, cuidado e muita informação dá para se aventurar por ai. No
fundo no fundo, viajar sozinha não é um problema quando você não se sente
solitária.
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