terça-feira, 5 de abril de 2016

VARANASI; VIDA E MORTE

Varanasi, o que dizer desse lugar? Ela é uma das cidades mais antigas do mundo, além de ser um dos principais símbolos da Índia. É a morada do deus Shiva (um dos principais deuses do hinduísmo). Shiva é o deus da transformação, da destruição de todos os males. E Varanasi traz a perspectiva de um novo começo, de deixar morrer o velho para renascer o novo. É aqui que a maior parte dos indianos deseja morrer, pois acreditam que quem morre em Varanasi, atinge Moska, a liberação do ciclo de reencarnação.

Pra mim foi uma mistura de vários sentimentos... A excitação de chegar, o susto de me deparar com a sujeira do lugar, o respeito pela devoção e pelos rituais locais, a curiosidade de conhecer os Sadhus, o encontro com o rio que celebra a vida ao mesmo tempo que se despede dela. Essa é Varanasi! Foi aqui que aconteceu meu choque cultural... Foi aqui que me assustei e me encantei ao mesmo tempo. Nada nem ninguém pode te preparar para tudo se sente nessa cidade. Não é à toa que o “lema” daqui é: Você sai de Varanasi, mas ela não sai de você! Tudo é uma mistura de emoções, de conceitos (e às vezes os seus pré-conceitos e julgamentos que caem por terra). Todo o cenário, toda a cultura e todas as pessoas te fazem entender a crença fervorosa que eles carregam. A devoção e a ritualização te aproximam do seu Eu Interior, fazendo refletir que tudo é passageiro, tudo é impermanente.

Em Varanasi compreendi na prática o real significado de Santôsha (a sétima norma ética do Yoga e, particularmente a que eu mais gosto). Santôsha significa contentamento, o sentimento de darmos valor àquilo que temos e não nos lastimarmos por aquilo que não temos. Mesmo com todas as circunstâncias não favoráveis, como a sujeira e a condição social, não encontramos um único indiano que reclamasse da situação, da vida. Pelo contrário, encontramos muita gratidão nos olhos, nos sorrisos e nos gestos deles, independente das condições. É como aquele velho ditado: A beleza está nos olhos de quem vê. Estar contente é um estado de espírito, uma maneira elegante de estar no mundo, de contribuir para a vida fluir. 

Chegamos em um sábado à tarde e pra acessar o hotel tivemos que andar, com mala e tudo, desviando da multidão, dos tuk-tuks, das bicicletas, das vacas (e dos cocôs delas no chão). Nosso primeiro “passeio” foi para o crematório. O guia explicou todo o ritual e as crenças dos hindus em relação à morte. De tudo o que vi e ouvi, o que mais me impressionou foi o fato de que os Intocáveis ou Dalits (casta mais baixa da divisão social dos Hindus) é quem faz todo o serviço no crematório. Os Intocáveis são aqueles que fazem o trabalho “impuro” como lidar com o lixo ou com os mortos (animais ou pessoas). Por isso, também são considerados impuros e portanto não podem nem ter contato físico com os “puros”. Eles vivem marginalizados e separados do resto das pessoas. A eles, não é concedido nem o direito de rezarem nos templos. Apesar desse sistema de castas ter sido abolido em 1947 (era uma das coisas que Mahatma Gandhi lutava contra), infelizmente ele ainda é praticado, principalmente em relação aos casamentos entre os Hindus. E por que isso me impressionou? Porque na hora da morte nada disso importa mais. Do pó viemos e ao pó voltaremos. Os “puros” e “impuros” ficam lado a lado para realizar a cremação e liberar a alma do corpo morto. 


Logo depois fomos em um ritual de agradecimento à deusa Ganga (o rio Ganges). Conta a história, que Ganga era uma deusa que queria descer à Terra para atender aos pedidos dos homens. Mas ela tinha muita energia e partiria a Terra ao meio se descesse diretamente. Os homens pediram ajuda à Shiva e esse disse a Ganga que primeiro descesse em sua cabeça. Após diminuir sua força, Ganga poderia descer a Terra sem prejudica-la. Para os Hindus, tomar banho no Ganges significa a redenção dos pecados humanos. A vida não estaria completa sem tomar banho no rio ao menos uma vez. E é isso que vemos em todos os lados, homens e mulheres (e crianças e vacas também) se banhando no rio, rituais de agradecimento às bênçãos recebidas e celebração pela vida. O mesmo rio que recebe cinzas de corpos mortos, também recebe oferendas, cantos e rituais dos vivos.


Chegando em Varanasi

Amanhecer no Ganges

Ganga e Varanasi 

Banho no Ganges

Passeio de barco

Banho no Ganges

Oferendas (Puja)

Nosso Puja à Ganga

Admirando e agradecendo

Saris ao vento

Encontro com os Sadhus

Fazendo novas amizades... 








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